quarta-feira, 4 de julho de 2007

Sr. Urbano kauss

Que as cidades são organismos vivos, com todos os seus fisiologismos, não se pode olvidar. Assim como num corpo de carne e ossos, a analogia é perfeita. A vigilância policial opera como suas "im-unidades" aparelhadas para defesa contra quaisquer organismos deletérios. Os parques, com suas árvores "brônquicas" fazem a vez dos pulmões, garantindo a qualidade do ar. Os rins, estações de filtragem e tratamento de água e a rede de canais de esgotos purificam o sangue que dá vida à cidade. A enervação se faz representar pela rede elétrica e assim por diante, vai o ser vivo se constituindo, vivendo, crescendo, adoecendo, tratando-se... e até morrendo.

No meio de toda esta fisiologia, lamentavelmente, ao menos onde vivo, freqüentemente me vejo na mais abjeta condição, ainda que eu não seja lixo ou qualquer coisa desprezível, mas, antes, um elemento de excelência rara, conforme posso constatar, comparativamente. Contudo, quando o cérebro do gigante __ou nem tanto__ corpo em que me encerro é um cérebro oligofrênico, demente e incapaz, portanto, de manter-se bem ordenado, muita coisa se perde.

É assim, pois, que suportando a tortura de intermináveis momentos, encapsulada em meu automóvel quase imóvel, eu me encontro sufocada entre tantos outros, sob o efeito da emissão de gases nocivos e fétidos, à mercê do trânsito lento, obstipado da única via de escoamento rodoviário da cidade... a porção terminal desse intestino grosso no qual sou reduzida à desprezível condição de fecalito em meio a outros fecalitos e tantos outros fecalomas, ou seja: ônibus, caminhões, carretas, caçambas... lentos, pesados, grandes, produtores de mais gases tóxicos, impactantes e incômodos como tumores formados de fezes que, por terem se demorado excessivamente nas vias digestórias, pela morosidade e pela pouca fibra, foram-se ressecando e endurecendo e obstruindo a luz do túneo intestinal. Assim é que cidadãos valorosos que poderiam e deveriam ir e vir livremente no cumprimento de seus deveres ou no gozo de seus direitos mais básicos, são tratados como merda e ficam imobilizados em meio a uma estrutura autodestrutiva.

Fossem as vias de acesso e escoamento livres de obstrução, os horários planejados e cumpridos fisiológica e inteligentemente, e os recursos distribuídos com equidade e justiça, o organismo urbano teria uma constituição saudável e uma vida mais feliz, assim como um crescimento pleno e uma produtividade esplêndida. É certo que envelheceria, naturalmente. Mas de forma digna e admirável, tornando-se uma referência, um lar, um berço de cultura e prosperidade, em vez de um infecto e decrépito moribundo, destruindo suas células e relegando seus mais preciosos tesouros aos parasitas.

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