Menos de um século atrás tudo era pontuado de romantismo, brumas de mistério e atos heróicos e qualquer fato corriqueiro tomava ares de "novel" nas talentosas mãos escritoras.
Mulheres sonhadoras, homens amargos, velhos oráculos, vilas bucólicas, ilhas paradisíacas, animais mitológicos... Todos, elementos sublimes e encantadores. Desfilavam seus perfis magníficos em meio à trama bem urdida de contos e romances memoráveis que até hoje norteiam os pensamentos refinados.
Cada carruagem escondia um segredo cheio de fidalguia. Palácios e cabanas tinham personalidade, identidade e história. Florestas tinham magia. Crianças tinham inocência. Jovens tinham ideais!
A fantasia ainda não era um negócio rentável.
As casas, nem "populares", nem "despojadas". Eram lares, ou redutos de um clã... ou propriedades com nome e idade.
... E os bares? Ah, os bares... havia as tabernas rústicas, os cafés elegantes, os clubes noturnos, povoados de bárbaros embriagados, ou de atormentados boêmios e vadias... Todos tão pitorescos!
Havia lugares remotos, desconhecidos, paraísos perdidos, monstros, dragões... Ou pelo menos leitores que acreditassem neles.
Da Europa ao continente americano, íam-se meses a bordo de embarcações a vela... Ou da Inglaterra à Grécia, em trens a vapor. As pessoas se correspondiam por cartas escritas à mão.
Hoje acordamos eletrônicos, tomamos café no bar da esquina, em pé diante de um balcão apinhado, ou um suco de embalagem tetrapack depois de uma hora histrônica na esteira, ouvimos imóveis os automóveis, nos arrasatamos lentamente engarrafados,ao trabalho, ou vamos espremidos como sardinhas enlatadas em ônibus e metrôs lotados... Almoçamos em fastfoods ou selfservices, vamos ao shopping center, moramos em condomínios e vamos de avião a qualquer lugar. Os bares às vezes são temáticos, os garçons, antipáticos, os cardápios exóticos, e os boêmios... performáticos.
Vestimos roupas sintéticas e quase descartáveis, e quase só nos falamos por instrumentos eletrônicos.
O mundo é uma aldeia, passamos a vida na "rede", mas índios quase não há, a não ser na mídia.
O banco da praça agora é na lan house, o coreto é balada, caixinha de música é ipod, pombo-correio é torpedo, os canhões estão nas estrelas; as estrelas, no cinema; o cinema nas casas; as casas, penduradas até nos morros, que já não têm samba, que já não é de "bamba", que já não é mais nada...
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2 comentários:
Fiquei com vontade de escrever um conto a respeito desse tema. Porquê tudo foi sempre a mesma coisa.
Mas o passado sempre é vestido de romantismo. Não só o passado das carruagens, mas a gente constuma romancear a nossa vida há uns meses atrás, sempre, não importa em que situação.
hmmmm este texto precisa virar uma canção... um bom mpb... na voz do seu Jorge... imagine...
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