Talvez porque fossem brancas as roupas tremulando nos varais, o sol se derramando por elas.
Talvez porque fosse manhã de verão de céu lavado, tudo luzindo como se fosse eterno.
Recostou-se na espreguiçadeira da varanda, fechou os olhos e viu...
Barco tosco singrando o mar até o porto das Margaridas, brisa suave, jovem rapaz
de cabelos desgrenhados e cutis muito jambo, sorrindo pra tudo.
Era jovem, afinal. Pra que razões? Sorria porque tudo lhe favorecia.
Lembrou de como a fazia sorrir também. E como eram sauves seus carinhos.
Como a marola quebrava nos pés, quando andavam pela praia. Como era a luz
tépida do entardecer no olhar apaixonado. Como era o beijo, também morno e doce,
que não tinha fim. O cheiro de lavanda e as besteiras que diziam no pier
debaixo de um rebanho de milhões de estrelas e uma lua branca a pastoreá-las.
Tudo o que momentaneamente fora tão vívido foi ficando tênue sob uma sombra repentina.
Talvez porque uma imensa nuvem cobrisse o astro-rei como um manto enorme
e a manhã virasse quase noite, um breu apavorante torturado por rajadas de vento úmido.
Rude tempestade a sacudir os sonhos de uma manhã tão bela.
O vento varrendo agora a poesia de lembranças remotas mais depressa do que as roupas
pudessem ser recolhidas dos varais... e ela mais só e triste, olhos abertos
rasos de lágrimas e da chuva fina que anunciava o temporal. Choveu forte e breve
com pancadas como açoites. Depois tudo sorriu novamente, porém com certa desconfiança.
A tarde colorida e molhada exalava saudades resignadas.
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Um comentário:
Quanta realidade encerrada nessa narrativa tão sensível e saudosista de uma memória que por sua natureza de passado, faz o céu chorar.
É bonito e toca pela sensibilidade e honestidade de uma lágrima, de uma lembrança.
Muito gostoso, li várias vezes em dias diferentes. E me entristece e agrada.
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